Em sua oitava edição a revista Impacto Contando Histórias, agora publicada em plataforma digital, ao relatar fatos e ouvir autoridades mostra que em Iporá também é significativo e gritante o número de casos de abusos sexuais.
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O abuso sexual de crianças é uma chocante realidade na sociedade iporaense. Uma triste história que precisa ser contada para alertar as famílias de que o predador pode estar muito mais perto do que se imagina. No último ano, a rede de proteção que inclui o CREAS (Centro de Referência Especializado em Assistência Social), Conselho Tutelar, Polícia Militar e judiciário recebeu denúncias de mais de 90 casos suspeitos. Em 100% destes, os abusos foram cometidos por um parente, com destaque para padrasto, avô, tio e primo.
As situações acompanhadas pelos profissionais vão na contramão do que se espera como proteção por parte de uma família. Quando um pai ou parente próximo abusa de uma criança, ele causa traumas que nunca serão apagados. Alguns acumulam sofrimentos. É o caso de uma criança especial e doente de 12 anos, que com grande dificuldade conseguiu contar na escola que era vítima do pai, que dizia dormir com ela todas as noites para protege-la. A mãe confessou que era conivente com a situação e que se não fosse com a filha, seria com outra.
O sentimento de posse é comum. Alguns dizem que fazem por amor, outros alegam que é um despertar sexual saudável, que ele quer ensinar como fazer… A tendência é pegar o inibido, o tímido, o fraco. De forma paciente, o abusador vai ganhando confiança da vítima que de forma inocente acredita que não há nada de errado. “Não confia no tio?” ou “esse é nosso segredo” são formas comuns de convencer as crianças. Mas, depois de um tempo, se torna ameaça quando o abusador diz à criança que se ela não aceitar ou contar o que está acontecendo, sua família será machucada ou morta.
Mas, nem todas as crianças são dominadas pelo medo. Duas priminhas de 5 e 8 anos foram abusadas pelo namorado de uma das mães. O homem passeava com as duas de carro e cometia os crimes. A mãe não percebia nada mas a tia (mãe da outra) observou que sua filha chorava muito quando ia para a casa da prima e suspeitou. As crianças passaram pela escuta qualificada, quando uma equipe composta de profissionais como Pedagogo, Psicólogo e Assistente Social ouvem a vítima na UPA ou no Hospital Municipal. Menores de cinco anos fazem corpo de delito para comprovar. Acima de cinco anos passam pelo exame e pela escuta qualificada. Os abusos aconteceram por cinco meses. O suspeito está preso. A mãe displicente perdeu a guarda da filha que está com a avó.
Para o Promotor Sérgio de Sousa Costa da 2° Promotoria de Justiça de Iporá, “infelizmente é grande a quantidade de casos e denúncias oferecidas pelo Ministério Público envolvendo violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes em Iporá. Em geral, os agressores são pessoas do convívio da criança, parentes ou outras pessoas próximas.”
Campanhas educativas tem surtido efeito e amenizado a situação. Em 2019, durante o Maio Laranja, a equipe do CREAS visitou as escolas do município para falar da importância das crianças denunciarem os abusos sofridos em casa. Uma menina de 14 anos foi até o CREAS e relatou que era vítima. Ela foi direto para a Casa Lar, que acolhe crianças em situação de vulnerabilidade familiar, e não voltou mais para casa. Era uma criança muito triste e que se automutilava para aliviar o sofrimento de ser violentada por um familiar.
Abusadores e abusados contam com uma rede especializada de acompanhamento. “O CREAS em Iporá tem um papel fundamental para as famílias que se encontram em vulnerabilidade social. Percebemos que através do trabalho feito nas escolas, em nossas redes sociais e lista de transmissão, nos últimos três anos, as crianças tem tido menos dificuldade em falar sobre o assunto, e consequentemente o período do abuso é menor, podendo colocá-lo em segurança com mais rapidez. Não é um trabalho fácil! Não dá para ter uma noite de sono tranquila, depois de se inteirar de muitas histórias. Considero que tivemos muitos avanços. A justiça está sendo feita com mais rapidez. Não é uma história de outrora, é de agora. Elas estão falando!”, comemora a Secretária de Assistência Social, Hayzza Haytt.
Dr. Samuel João Martins, Juiz da Vara da Infância e Juventude, também vê avanços através do Programa Justiça em Rede que capacita servidores para atender de forma especial as vítimas e se reúne regularmente com CREAS, Conselho Tutelar, representantes de escolas e Assistência Social para traçar ações de prevenção e atendimento.
Infelizmente, somente um abusador demonstrou arrependimento depois do acompanhamento feito pela equipe do CREAS. Mas, felizmente, em nenhum dos casos houve reincidência. Certamente não foi por arrependimento, mas para não arcarem com as consequências. “Quando há notícia de abuso ou exploração sexual contra crianças e adolescentes, a atuação do Ministério Público ocorre, basicamente, em duas frentes. A primeira, na esfera criminal, em que, após apuração realizada pela autoridade policial, a investigação é encaminhada ao Ministério Público para propositura da ação penal pelo Promotor de Justiça, que acompanha o feito até a sentença judicial. Há, ainda, atuação na esfera cível, perante a vara da infância e juventude, através da propositura de medidas protetivas em benefício da criança ou adolescente vítimas de abuso ou exploração sexual, que vão desde a requisição de acompanhamento psicológico e apoio temporário à criança e à família da vítima, até a retirada da guarda, acolhimento institucional em entidade, colocação em família substituta e, até mesmo, a destituição do poder familiar do agressor”, explica o Promotor.
Chama atenção o fato de que 30% dos casos são cometidos em meninos e os abusadores são homens e na sua totalidade são o avô ou primo da vítima. “Essa marca vai ficar; mas não pode ser uma ferida. Se a vítima não for acompanhada, ela não vai namorar, vai se automutilar. Os abusadores colocam na criança que a culpa é dela. No acompanhamento, ela vai reconhecer que ela é vítima. Ela acha que tinha participação de uma maneira ou outra. Nosso objetivo é ajudar a não ter reincidência. Que o abusador entenda que a criança não é objeto de prazer para o adulto”, comenta a Coordenadora do CREAS, Ivane Assunção.
ALGUNS SINAIS PODEM AJUDAR A IDENTIFICAR SE A CRIANÇA SOFRE OU SOFREU ABUSO SEXUAL, COMO:
– Apresenta marcas de agressão ou machucados, tem dificuldade de andar ou sentar;
– A criança está agressiva, irritada ou machuca o próprio corpo;
– Está muito quieta, triste, medrosa ou chorosa;
– Passou a ter transtornos alimentares;
– Passou a ter alterações de sono, fica cansada fora de hora ou tem dificuldade para dormir;
– Mudou seu comportamento e aparência;
– Está desatenta na escola ou desinteressada em atividades e brincadeiras. Apresenta dificuldades de aprendizagem;
– Faz desenhos agressivos, que mostrem situações de medo ou cenas envolvendo questões sexuais;
– Evita ir para alguns lugares ou encontrar alguma pessoa.