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Leão XIV: o silêncio das heranças

Jairo : filósofo e padre

O gesto de escolher um novo nome ao ser eleito Papa nasceu no ano de 533, quando João II decidiu não conservar o nome de batismo, Mercúrio, por estar ligado ao panteão pagão. A partir dele, a Igreja iniciou uma tradição silenciosa e simbólica: cada sucessor de Pedro passaria a receber um novo nome, como quem assume um novo coração e uma nova missão.

No Conclave de 2025, os cardeais, orientados pelo Espírito, escolheram o cardeal Robert Francis Prevost, norte-americano de origem, mas naturalizado peruano, homem de duas pátrias e de uma só fé. Ele aceitou a cruz e o cajado do sucessor de Pedro, escolhendo para si o nome de Leão XIV.

O nome ressoa como homenagem delicada e firme a dois expoentes da Igreja: Leão Magno, doutor e santo, pastor que enfrentou com coragem os ventos do império e da heresia; e Leão XIII, o Papa da luz social, tecelão das primeiras linhas da Doutrina Social da Igreja, homem de cultura e contemplação.

Outros enxergam no nome uma alusão ao singelo Irmão Leão, companheiro e confidente de São Francisco de Assis. Como se o novo Papa, com essa escolha, quisesse declarar sua proximidade espiritual com o Papa Francisco, herdeiro do poverello, e assim lhe prestar silenciosa homenagem.

Muitas vozes, em diferentes tons, tentam adivinhar os rumos que a Igreja tomará nos próximos anos. Mas antes de olhar adiante, é preciso ouvir o eco do nome escolhido e contemplar suas raízes.

Leão não foi um nome adotado por Leão I ao tornar-se Papa. Era o nome que já trazia consigo desde o nascimento. Seu pontificado, entre os anos 440 e 461, foi tão luminoso que a história lhe concedeu o título de Magno. Naqueles tempos, ainda não era costume mudar de nome ao assumir a cátedra de Pedro.

Era comum, na cultura latina dos primeiros séculos, que as pessoas recebessem nomes ligados a animais, como Áquila, a águia; Ursus, o urso. No entanto, tais nomes nunca foram escolhidos por outros papas, talvez por não carregarem a mesma carga simbólica e espiritual do nome Leão.

Os sucessores de Leão I podem ter adotado seu nome como sinal de reverência a sua grandeza e como desejo de espelhar sua firmeza. Afinal, Leão Magno foi mais que um administrador da Igreja. Foi uma presença marcante na história, capaz de unir fé e razão, coragem e doçura, governo e humildade.

Ao se chamar Leão XIV, o novo Papa parece erguer um elo entre passado e futuro, entre o vigor da doutrina e a escuta fraterna dos tempos. Aproxima-se, assim, dos dois papas que mais dignificaram esse nome: Leão I, proclamado doutor da Igreja, e Leão XIII, cuja voz ainda ressoa nas encíclicas sociais que moldaram a consciência cristã no mundo moderno.

Mas há ainda um nome mais alto que todos os nomes. No Apocalipse, Cristo é chamado de Leão da tribo de Judá. Todo Papa, ao aceitar esse ministério, torna-se sinal visível daquele que governa invisivelmente a Igreja. Carrega, em seu ser, os traços do Cordeiro e do Leão. Serve com mansidão, guia com firmeza, ama com inteireza.

O nome Leão, por si só, carrega múltiplos significados. É símbolo de força, realeza, coragem e sabedoria. O leão é o único entre os felinos que vive em grupo, o que revela um sentido profundo de unidade e pertença. Quando esse nome se une a uma pessoa, evoca liderança e responsabilidade. Quando é dado a um Papa, torna-se convite à comunhão, à firmeza serena, à vigilância amorosa.

Há ainda outro sentido nesse nome, vindo das páginas do Evangelho. Leão é também o símbolo de São Marcos, cujo evangelho se abre com a voz de João Batista, clamando no deserto com força e urgência, como o leão que ruge nas aridez do deserto, preparando os caminhos do Senhor. Nesse rugido sagrado ressoa a missão do novo Papa: despertar corações, abrir veredas, chamar o mundo à conversão, à esperança e fazer ecoar a força de sua voz nas áridas “periferias existenciais”.

Leão XIV carrega em si o peso da história e a leveza da esperança. Seu nome é mais que título. É semente, é chama, é direção. Fala de continuidade e também de renovação. Fala de um coração que, ao escolher como se chamar, escolhe também como servir.

Texto de Jairo Barbosa Moreira, que é filósofo e doutor em educação pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Atua como padre na Paróquia São Pedro, em Novo Planalto, na Diocese de Cristalândia.

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