A festa da padroeira de Iporá é uma tradição que deve continuar e até ser estimulada cada vez mais. Conheço esse entusiasmo pagão-religioso há mais de 60 anos, quando por aqui reinava o Frei Henrique na igrejinha da praça onde hoje é a rodoviária, e sempre teve essa forte participação popular.
Antigamente era a época em que as famílias amigas marcavam encontros, programavam os batizados, porque as estradas e os meios de transporte não ajudavam muito e as locomoções não eram fáceis. Primeiro, os percursos eram feitos só à pé, em carros de bois ou em lombo de cavalos; depois surgiram as bicicletas, os pequenos caminhões a manivela, as motocicletas e, tempos mais tarde, os Jeeps Willys, com tração nas quatro rodas. A festa era o grande atrativo para os encontros anuais entre famílias amigas.
As coisas foram ficando mais fáceis, à medida que o tempo foi passando, fazendo com que as distâncias e a qualidade das estradas deixassem de ser problema, o que não impediu que as pessoas continuassem a marcar encontros anuais e batizados na época da festa da padroeira. Têm muitos iporaenses que hoje moram fora, que não perdem a festa de Maio nem que a vaca tussa. É sagrado estar por ali na semana do dia 24, para agradecer à padroeira as bênçãos alcançadas, pedir proteção para mais um ano e depois passear pelas barraquinhas e rever amigos.
Na realidade, depois da devoção à Santa padroeira, uma das maiores atrações da festa de maio sempre foram as barraquinhas. Primeiro, lá pelos anos cinquenta-sessenta do século passado, eram os mascates que atraíam mais gente, porque traziam enormes malas com roupas de cama, mesa e banho, além de confecções diversas, não muito comuns no comércio local e a preços bem camaradas. Todo mundo deixava para comprar roupas para as mulheres e crianças, nessa época. Eram roupas para passar o ano, até chegar a festa do ano seguinte. Depois vieram outros atrativos, como utensílios de alumínio, de plástico, brinquedos, mais recentemente as muambas do Paraguai, tudo a preços bem mais acessíveis. E o parque de diversões, então? Esse nunca podia faltar, para a alegria da criançada. Era, e continua sendo, a tradição, e em tradição não se mexe, principalmente quando tem santo envolvido. Não é bom
cutucar leão com vara curta…
As barraquinhas, antigamente, eram instaladas próximas à igreja católica, que era a sede oficial da festa, e isso desde os tempos em que a igreja era na praça onde hoje é a rodoviária. No entanto, já há muito tempo empurraram essas barraquinhas para bem longe da igreja. Que maldade! Não sei quem fez isso, mas deve ter sido algum prefeito não muito católico. Só pode ter sido! Fato é que a festa, depois disso, adquiriu um caráter muito mais pagão que religioso. Aos poucos foram empurrando as barraquinhas e as diversas áreas de estacionamento – que agora se fazem necessárias -, para as pontas das ruas, marginalizando a importância do evento. E não pode! Penso que é até pecado fazer isso. Elas fazem parte de uma tradição que deve ter quase cem anos, onde se divertem homens, mulheres, crianças, católicos, evangélicos, espíritas, ateus, pretos, brancos, marrons e todo tipo de gente. Por que empurrar a festa para o fim da cidade, para a ponta da rua ou para dentro do comércio principal da cidade?
Bairros que se tornaram importantes e essencialmente residenciais, como o bairro Sossego, passaram a fazer parte dos privilegiados setores para onde as barracas, as casas de shows musicais, o parque de diversões e a alegria noturna se espalharam, junto com os ‘banheiros’ ao ar livre. Os outros bairros devem ficar com inveja, principalmente porque é a oportunidade que muitos moradores têm de fazer um dinheirinho extra, alugando suas calçadas, vagas para estacionamentos e banheiros para as mais diversas finalidades. Quem sabe não esteja na hora de ceder a honra a outros bairros, democratizando esse privilégio?
Pensando bem, é muito mais lógico e ideal que se coloque as barracas da festa nas ruas do entorno da igreja católica, como era antigamente. Como ficaria bonito aquilo lá, com essas ruas cheinhas de barracas iluminadas à noite, parecendo procissão em direção à casa Santa, aproximando a criatura do criador, ou seja, as barracas do motivo de existirem. Aí sim, as coisas estariam mais autênticas, inclusive até bem mais ecumênicas, juntando as pessoas das diversas religiões perto da sede da festa, já que uma boa parcela dos que frequentam as barraquinhas não é de católicos. Essa aproximação certamente só traria alegria à Santa, vendo a confraternização entre as pessoas de diversos credos.
Estando lá longe, para onde foram sendo empurradas, essas barracas deixam, praticamente, de ter ligação com a homenagem à padroeira e passam a ser só o lado profano da festa de Maio. E a Santa, coitadinha, fica a ver navios… Como proposto, as pessoas de todas as religiões voltariam a se aproximar da primeira de todas as igrejas cristãs do mundo, que é a Católica, diminuindo as diferenças.
Vamos, então, retornar com as barraquinhas para perto da igreja católica, de onde nunca deveriam ter se afastado? Afinal, como diz o provérbio popular: QUEM PARIU MATEUS QUE O EMBALE!