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RELEMBRANDO MULHERES: As “Irmãs holandesas” em Iporá – parte I

Irmãs no navio rumando para o Brasil. Na foto do navio, estavam: Irmã Bernadeth Irmã Carla, Irmã Margareth, Padre. Paulino e Irmã Eisabeth.

Texto do historiador João Paulo Silveira (UEG de Iporá) e com co-autoria do Padre Rodrigo Antônio Alves Ferreira

Depois de algum tempo de pesquisas, conversas informais, leituras de cartas e documentos, propusemo-nos à publicação de três breves textos sobre as Irmãs Passionistas Missionárias de Santa Gema que dedicaram suas vidas a Iporá e região. Este é o primeiro da série de textos sobre as irmãs Benigna Auer (1925-1998), Elizabeth Roijers (1928-2006), Gabriela Schellenkens (1927- 2019) e Miguela Hoenselaar (1929-), personagens de nossa história que viveram quase quatro décadas em Iporá e que até nossos dias aquecem a memória local. Aqui, para nos remetermos ao historiador italiano Carlo Ginzburg, compartilhamos por alguns fios e rastros que definiram no passado o que somos hoje.

No contexto do Dia Internacional das Mulheres, lançar luzes sobre a experiência passada das “Irmãs holandesas”, como ficaram conhecidas entre aqueles que delas se lembram, é uma forma de homenagear todas as mulheres que também construíram nossa cidade.  A história que não considera a realidade das mulheres, suas contribuições, sofrimentos, lutas contra o machismo e realizações, está fadada à incompletude quando pensamos em uma história total. 

A Congregação Passionista foi fundada por São Paulo da Cruz, no norte da Itália, em 1721. Em 2021, celebramos os trezentos anos da ordem que enviou religiosos para vários cantos do mundo, inclusive para nossa região. Missionários homens e mulheres que se estabeleceram aqui, a maioria vinda dos Países Baixos, tiveram um importante papel na formação da Diocese de São Luís dos Montes Belos. Nascia no final dos anos de 1950  a experiência católica “batavo-cerratense” marcada pelas trocas recíprocas entre os estabelecidos na região e os recém chegados do Velho Mundo. 

As irmãs passionistas missionárias se constituíram, como grupo, a partir de um mosteiro dedicado a Santa Gema Galgani, situado em Sittard, nos Países Baixos. Saídas de lá, duas jovens freiras, as irmãs Vicência e Margareth Cooren – irmãs de sangue, inclusive -, criaram no dia 27 de dezembro de 1948 o primeiro convento das Irmãs Passionistas Missionárias de Santa Gema, na cidade de Mook.

Ainda na Holanda, outras seis jovens dispostas a iniciar a comunidade missionária passionista acompanharam Irmã Vicência Gooren (1919-1990). Uma delas foi Gabriela, querida pelos iporaenses mais maduros que se lembram dela. O objetivo da nova comunidade era o cuidado dos próximos e vulneráveis a partir da enfermagem e da educação, conquanto estivessem preparadas para desafios ainda maiores. 

Várias jovens se uniram às irmãs passionistas e o primeiro convento ficou pequeno. Em outubro de 1954, as irmãs inauguraram uma nova casa, chamada Stella Duce, também em Mook. Nesse espaço, elas cuidaram de idosos e se dedicaram ainda mais aos estudos, especialmente da enfermagem e da pedagogia. Como parte de seus exercícios espirituais e de convivência, também confeccionavam roupas litúrgicas, cuidavam da terra e se preparavam para missões no além-mar. O ânimo missionário fez com que o Brasil interessasse às jovens religiosas. Antes delas, padres holandeses, entre eles Stanislau Arnoldo van Melis (1911-1998), já haviam chegado em Goiás.

Em 05 de novembro de 1960, as quatro primeiras irmãs partiram para o Brasil. De Roterdã ao Rio de Janeiro, a viagem durou cerca de 20 longos dias de navio. Nesse grupo, estavam as Irmãs Elisabeth e Bernadeth Caspers (1924-2017). Durante um ano, elas residiram em Goiânia a fim de aprenderem o português. Posteriormente, moraram em Anicuns, quando Padre Wiro van Vliet (1927-2009) era pároco da cidade. Aliás, foi ele que as convidou para o trabalho católico naquele município.  Finalmente, em 20 de abril de 1963, as irmãs chegaram em Iporá, segundo apontam os registros. 

Sob o olhar paciente do Morro do Macaco, a comunidade das irmãs passionistas de Santa Gema desenvolveu diversos trabalhos, como muitos ainda se lembram. Elas certamente marcaram a vida da cidade, mas também foram marcadas pela convivência e pelos desafios daquela época. As irmãs foram recebidas no Bairro São Francisco pelos padres passionistas que já residiam em Iporá e por uma multidão de gente que compreendia que naquele momento a comunidade católica e iporaense se fortalecia. 

Elisabeth e Bernadeth eram enfermeiras e vieram para Iporá com objetivo de assistirem às mulheres grávidas. Nos primeiros quatro anos, os partos aconteciam nas casas das famílias, mas logo criaram a maternidade, inaugurada em 04 de junho de 1968, localizada na Avenida Goiás.  Além de atuar como enfermeira, a irmã Elisabeth foi nomeada a diretora da Creche Chapeuzinho Vermelho assim que chegou na cidade. 

Nos primeiros anos em Iporá, as irmãs residiram na antiga casa paroquial, situada na Avenida 15 de novembro. A partir de julho de 1968, passaram a viver definitivamente em uma casa, junto à maternidade, na Avenida Goiás. As irmãs afirmavam que, durante sua atuação na enfermagem local, fizeram mais de 1500 partos. Sem dúvidas, muitos que vivem em Iporá e, possivelmente, alguns dos leitores deste texto nasceram com a ajuda e o cuidado delas. 

Ao todo, dezoito religiosas passionistas se estabeleceram em Iporá e região ao longo de cerca de dez anos, desde que o primeiro navio atracou no Rio de Janeiro. Elas residiram e trabalharam em Anicuns, Iporá, São Luís de Montes Belos, Firminópolis e Goiânia. Ajudaram os pobres, atenderam, sem reservas, ao povo e construíram também a diocese de São Luís de Montes Belos.  As irmãs se dedicaram-se às questões sociais daqueles dias e marcaram com sua presença parte sensível da realidade da qual nós fazemos parte hoje. 

Em outro momento, falaremos sobre cada irmã que viveu em Iporá, destacando suas experiências de vida e atuação em nossa comunidade. Oportunamente, convidamos o leitor que se dedicou a este breve recorte de memória ao entendimento de que nossa sociedade dependerá sempre de nossa luta em favor da presença feminina nos espaços diversos, seja na política, no trabalho, na religião, nos esportes, na educação ou no lar. Por essa razão, o dia 08 de março é um marco temporal para reavivarmos esse ânimo que deverá ser cultivado em todos os dias do ano. 

Aguarde mais dois textos sobre este interessante assunto

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